Adiar a vigência da LGPD para 2022 é a solução?

LGPD escrita em cima da bandeira do Brasil

A vigência da LGPD é o tema do Projeto de lei 5.762/2019, apresentado recentemente na Câmara dos Deputados, cuja ideia é adiar a data da entrada em vigor de dispositivos da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD – para 15 de agosto de 2022. Ou seja, postergar a vigência da LGPD em 2 anos sob o argumento de que “as empresas não estão prontas”.

Realmente, muitas empresas mostram-se despreparadas para as exigências legais sobre governança e proteção de dados pessoais, mas nisso vejo o maior motivo para a urgência no vigor da LGPD: nada melhor que uma norma estabelecendo direitos e deveres para forçar medidas de conformidade.

Por isso que, quando falamos o termo segurança jurídica, muitas vezes nos referimos ao arcabouço legislativo que existe a respeito daquele tema.

A lei, pelo seu próprio espírito, deve ser uma forma de impor limites e obrigações, gerar previsibilidade na conduta de outrem e, com isso, construir um terreno firme para a prática de relações e fatos juridicamente relevantes. Sem lei, sem segurança jurídica.

Vigência da LGPD adiada, tratamento desregulado.

Monitor, Binária, Sistema Binário, Computador

A LGPD vem para oferecer segurança jurídica para uma relação no interesse de, nada mais nada menos, direitos fundamentais. Proteger dados pessoais não é uma moda, não é “hype”, é uma urgência da sociedade da informação!

Para os mais céticos que ainda duvidam que a questão seja um Direito Fundamental, é relevante lembrar a PEC 17/2019, que já foi votada no Senado Federal sem qualquer voto contrário e vem para constitucionalizar expressamente a questão como Direito Fundamental.

Devido a isso, a Senadora Relatora da PEC, Exma. Simone Tebet esboçou o entendimento que a proteção de dados já pode ser encarada como uma extensão da intimidade, tornando pública a seguinte declaração:

Constitucionalizar a questão significa o Estado dizer que reconhece a importância do tema, classificando esse direito à proteção de dados como fundamental. Ou seja, o Estado, a sociedade, o cidadão, podem ter direito, como regra geral, ao conhecimento do outro, desde que haja realmente necessidade. Do contrário, é preciso preservar ao máximo a intimidade e a privacidade dos dados

Senadora Simone Tebet para Agência Senado

O paradoxo é que muitas empresas clamam estarem despreparadas para cumprir um direito fundamental internacionalmente reconhecido, qual seja a proteção de dados pessoais, por outro lado, “estão prontas” para realizar o tratamento e venda indiscriminada dos dados pessoais.

Se for aprovado esse projeto de lei 5.762/19, o Brasil pode participar de um retrocesso… Uma vez que diversos outros países já aplicam sua própria norma neste assunto, o que pode gerar consequências econômicas negativas.

Sem lei de proteção de dados, problemas à vista!

Globo, Terra, Mundo, Globalização, Planeta, Global

Para citar como exemplo, o próprio capítulo V do GDPR (General Data Protection Regulation) prevê diversas regras para o fluxo transfronteiriço de dados para países terceiros e impõe que transferências internacionais de dados só devem ser permitidas quando as condições do GDPR sejam respeitadas.

Vários pontos como o possível isolamento econômico pela ausência de norma sobre o assunto, o fato de ser um direito fundamental reconhecido e a segurança jurídica que a LGPD vai trazer já foram debatidos no DDcast: “Episódio #05 Dados Pessoais sao vida

Podemos pensar até no efeito social, porque já não seria o primeiro adiamento, o que pode gerar a ideia de que não seria um assunto importante.

Os problemas só crescem, segundo nota pública da OAB/PE, o número de reclamações de consumidores junto aos PROCONs de todo o país envolvendo a utilização de dados pessoais aumentou exponencialmente nos últimos cinco anos, constatando em base de dados do Dados.gov 

Em  2014, foram 80 reclamações de consumidores envolvendo dados pessoais, por sua vez apenas no 1º semestre de 2019, “foram cadastradas 22.760 queixas acerca da utilização, compartilhamento e/ou consulta não autorizada de dados pessoais”.

No final das contas, a população, mesmo sem lei específica, já passou a enxergar que suas relações estão ocorrendo através de fluxo de dados e seus dados pessoais estão cada vez mais sendo tratados sob a ausência de qualquer regulamentação.

Proteção de dados pessoais é uma questão de estabelecer regras claras para um jogo que já está sendo jogado. Adiar mais ainda a vigência LGPD? é postergar o inadiável. Já somos um dos últimos, queremos mais?

Lucas Cortizo

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